Olhando assim, parecia que a vida tinha sentido, embora ele não quisesse procurar o sentido, embora ele não quisesse ser sentido, nem sentir. O lenimento de suas forças era brusco. Há forças nos sumidouros e nem um pouco na consciência. Algumas poucas e minguadas lágrimas obedeciam à gravidade. E ele (sempre o desconcertante ele implodido) estava lá, enxugando-as. Um furacão sentimental explodia no insensível criado pela pós-modernidade. A explosão era abafada, inaudível. Gostaria de não saber das mazelas, dos cânceres, dos internamentos, dos médicos, nem de santos, nem de anjos.
Não saberia se despedir. Não gostaria de saber. Ia àquele ato tão familiar. Longe, distante, frio. Caçaria palavras para descrever suas sensações. Misteriosas. Augusto dos Anjos não saberia descrever o corpo em decúbito corroído por algum mal. Falavam em siglas. Deletérios sem fim. Um dia de sol. Ninguém lembrava a chuva matinal. O sol ousou e venceu o dia de São José. As pessoas enegrecidas circulavam-no involuntariamente. Sufocado, jogou os amores-perfeitos e procurou ar.
Algo bom desmistificaria o termo. Egípcios, cristãos, espíritas, compositores. Autores. Esperava por uma resposta. Do tempo. Ou do próprio fim. Vagueava pela necrópole e visitava residências de moradores anônimos. Ou apenas nomeados. Datados. Imaginava situações lúgubres. Queria mesmo era saber como foram parar ali. E onde estavam. Como estavam. Cresceu entre aqueles arquitetônicos espaços mínimos para deitar eternamente o bem e o mal.
Lembrava e ria. Ruborizava-se. Colerizava-se. Enfraquecia-se. Perdia o sentido oferecido pela vida. Tomado pela vida. Não conseguia não evadir-se da realidade. Esquecia e chorava.
Alguém o chamou para últimas palavras. Fez um discurso falso. Esqueceu-se propositadamente das Letras. Sentiu-se carpideira lesada pela falta de pagamento. Ouviu longe os aplausos que desferiam a morte com salves, vivas e outras entonações entusiasmadas. Todas hipócritas. Voltou o olhar para o horizonte de cruzes, mármores, anjos, santos e esquecimentos. E pessoas caminhando por espaços mal projetados, esgueirando-se pela vida. Escapou de alguns conhecidos desconhecidos, sentou-se num Carrara de um imberbe. Olhou-o profundamente, como quem conhecesse e sentisse falta. Sentiu-se carranca sempre de ótimo humor. O gosto de não ser sozinho durou pouco. E ali chorou a dor de sepultar o amor que tinha.
Peterson Nogueira
1º de abril de 2010
Uma mentira histórico-literária
6 comentários:
Nossa que texto lindo... Ain amigo quando vc vai lançar seu livro? Olhe eu quero o meu, como diz uma grande professora minha, eu quero meu livro pornografado!
- Todo sentimento, toda emoção, tudo pode virar um texto, frase, crônica... Escrever faz bem, e nos deperta para um mundo fora do normal, que vamos descobrindo cada vez mais. Adoro os seus textos. Muitíssimas saudades. :)
Muito Romantico...
Bem bom...
siiiiim, Adão terá continuidade, e aguarde, ele está cada vez melhor e cada vez mais tenso e cada vez mais horrorosamente belo e cada vez mais...
Sinceramente, tentador e intenso!
muito bom seu espaço, sigo!
Opa, Cristiano! Seja bem-vindo! Obrigado pelas considerações.
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